Agora são 6 horas da manhã, quase 7, eu não dormi bem, eu
desisti de tentar, e então peguei meu celular e comecei a digitar...
A anos atrás, 5 talvez, não sou boa em datas, eu estava em
situação parecida... Lá estava eu, sem dormir bem, tendo que acordar... Hora de
ir para a escola...
Eu sempre acordei na hora, na verdade bem antes dela... Mas
eu não saia da cama...
A realidade acordou mais cedo que eu, na verdade ela nem
foi dormir, ela sentou do meu lado e esperou a noite toda para que eu acordasse
e viesse me afogar nela, por isso eu tive pesadelos, porque é difícil dormir com alguém, ou então alho te
observando...
Ninguém nunca me ensinou a lidar com
isso, sabe, o desconforto... Com o medo... Com o desconhecido... No máximo me falaram o que fazer, me ditaram regras de
sobrevivência e me tacaram no mundo... Eu não sabia o que fazer... Bem, sabia,
mas não como, por isso eu ficava lá,
esperando algo me jogar pra fora da cama, pra me fazer... Fazer algo... Para me
fazer encarar a realidade... Ela não ficou ali me esperando a madrugada toda...
É melhor eu ir... Não vou decepcionar mais ninguém... Ou algo...
Ok... Eu me levanto... Não quero ir... As vezes eu criava coragem de ficar, e então o relógio
explodia e tudo ficava mais rápido, o que era para ser um descanso, uma fuga da
realidade, se tornam segundos, um pequeno relaxamento... Mas que não facilita a
tortura... Se eu fizesse isso todo dia eu ia repetir de ano... Se isso acontecer, eu vou ter que encarar tudo de novo... Não tem como fugir... Eu tenho que ir...
O ponto de ônibus é frio, ali sempre foi cinza, as pessoas
tem outras pessoas na qual podem dividir alguma calor humano, eu sempre ficava
longe, para não infecta-las com minha energia confusa e negativa... São adolescentes vivendo, tendo algo que na época eu não
tinha experimentado, uma vida social...
Escuto sussurros de meninas reclamando do quão gostam de um garoto, do quão seu ex-namorado é horrível, do quão
tal garota é falsa, do quão aquele sapato é bonito... A diferença entre eu e elas é gritante... Elas usavam
maquiagem boas, sapatilhas (algo que por causa do meu pé eu nunca pude usar),
roupas que as cores combinam... Eu não sei de mim, nunca consegui me olhar
bem... A
realidade só me deixava ver a realidade de fora, a minha e a de dentro estavam
uma bagunça, não podia olhar... Não dava...
Ninguém sentava do meu lado as vezes... Ou alguém aparecia
e eu não olhava no rosto... Meus fones de ouvido na qual um lado estava sempre
quebrado, um ouvido escutava algum rock pesado com letras depressivas, e no
outro sussurros na qual não posso entender... De um lado uma fantasia obscura, de outro uma realidade ilegível por
mim...
Cheguei... A escola... Tem apenas um portão, os
adolescentes entram como bois adestrados, devagar, eu fico observando de
longe... É hora de entrar...
A minha mente entra em estado de alerta, memorias me
mostram que aquele lugar é bem mais do que conhecido, eu passei bem
mais que momentos ruins lá dentro... Eu
passei pesadelos reais ali... Mas eu tenho que entrar... Eu tenho que fazer...
A realidade encosta no portão, me olha e me espera... Todo
mundo parece tão igual, sussurram as mesmas coisas, eles tem as mesmas
preocupações e nenhuma delas
é sobre morrer hoje, eles vão lá para viver mais um dia... Eu tenho que entrar... Tem pessoas esperando por mim... Estão esperando
para me pôr no chão, para me fazerem me sentir como se tudo não valesse a pena... Eles estão lá... Todos eles estão em harmonia, são como
notas de algum instrumento que eu nunca vou saber tocar, nunca vou saber
ouvir... Eu
sou a nota fora de tom, eles estão esperando para me moldar, para fazer eu
sentir quantos tons eu estou fora... Eu
tenho que entrar... Mas eu não vou...
Eu simplesmente dou meia volta, ando um tanto apressada no
sentido oposto da multidão, no meio de ônibus, para longe, para o contra, sem
olhar para os olhos de alguém... Eu toco minhas notas baixo, ninguém pode me ou ir aqui
fora, ninguém pode me notar... Eu não faço parte da orquestra, eu não faço
parte do show, eu não vou me apresentar hoje... Não hoje... E provavelmente amanhã também não...
Eu passo no centro, é muito cedo para algo estar aberto,
está completamente vazio, as vitrines já começam a fazer seu trabalho de tentar
chamar atenção, mas eu não olho através, mas sim para minha imagem distorcida,
meu reflexo claro, quase sumindo, uma
garota covarde com medo de ser diferente... Eu não sei quem eu sou, o reflexo
não diz quase nada...
Gosto do barulho do vento, gosto das primeiras cores do
céu, como os primeiros raios do sol trazem alguma cor para o cinza... De
repente eu estou bem, toda tensão se vai... A realidade sumiu... Eu estou
sozinha...
É bom estar sozinha quando se tem apenas inimigos, quando
todo mundo não quer estar do seu lado, ninguém por perto é bom, você não precisa de outra pessoa para existir, você apenas
existi, você pensa, você existi
Eu sento em uma praça, aonde a decoração nunca me parece
natural, mas naquela época era melhor que hoje, eu observo as folhas caírem
silenciosamente no chão, elas se desprendem dos galhos, e caem... Elas se
suicidam... Elas fazem isso... A arvore é a sociedade, as folhas são as pessoas...
As folhas secas estão morrendo porque
não sobreviveram, porque as folhas mais fortes sugaram todo o açúcar da
arvore, porque o doce da arvore não
daria para todos, mas algumas folhas querem bilhar mais, então algumas
folhas secam e caem... Silenciosamente, porque
a morte irrita, a morte assusta, ela não deve incomodar os vivos... Elas
caem... Eu cai, eu me desprendi, essa é minha queda, eu estou longe deles,
porque eu cai, eu estou no chão... É lindo não é? O como todos esses cadáveres
em tons laranja ficam no chão, o quão o vento os carrega para longe da arvore,
você pode ouvir as folhas batendo, o som delas agonizando... O vendo me trouxe
aqui, para perto das folhas secas... Para perto dos meus semelhantes... Eu olho
em volta, enquanto o vento bagunça meu cabelo quebrado... para onde o vendo vai
me levar no futuro? Para onde vai levar meu cadáver? Que seja para longe da
arvore...
...
5 ANOS DEPOIS EU AINDA ESTOU AQUI,
MAS QUE MERDA! ... Alias, em que estação nós estamos?
✵ Sou a favor da liberdade de expressão então se expresse como você quiser ✵
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"EU DISCORDO DO QUE VOCÊ DIZ, MAS DEFENDEREI ATÉ A MORTE O SEU DIREITO DE DIZÊ-LO" - Voltaire
Cecy, não vi nada de Hippie nisso... Vi uma obscuridade, e meio uma sensação desconhecida.... Diferente esse teu lado. <>
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