domingo, 20 de agosto de 2017

Você vai perder, e isso é inevitável e irreparável



  
Ela havia perdido parte de seu braço, era claro, e a imagem assusta de início, acho que qualquer ser humano fica ao menos um pouco chocado quando vê outro ser humano com alguma parte do corpo faltando. Eu me acostumei com a forma dela, mas a coisa que mais me chocou foi ela em si, foi como ela estava tão natural com aquela situação.

Nos primeiros momentos meus olhos escorregavam para seu braço, e eu no segundo seguinte puxava meus olhos de volta a estar contra os olhos dela, me questionando amargamente se eu havia a magoado, com um simples olhar, eu não queria que ela se sentisse diferente de mim, como se eu a tivesse a vendo como apenas um braço amputado, ou aparentasse ter algum sentimento de rejeição por ela, pois não, eu não sentia isso, mas a curiosidade e o choque faziam meus olhos irem naquela direção, eu queria perguntar sobre aquilo, mas sabia que uma simples pergunta poderia faze-la sentir como se eu estivesse invadindo um espaço, que eu não sei o quão sensível é.






Foi quando no nada ela disse “não vai perguntar sobre o braço?”, eu creio que sorri naquela hora, ao menos mostrei os dentes de um modo nervoso, e fiquei sem resposta, o que deveria responder? Eu não sei o quão delicado é isso, eu não faço ideia o que é passar por isso, e logo o como ela deve se sentir sobre isso.
Ela fez uma expressão estranha e disse “você notou, não notou?”, logico que eu notei, filha... pensei eu... “em um acidente, eu perdi...” disse ela...
Essa não era a resposta que a pergunta em minha mente estava fazendo, pois obviamente ela perdeu em algum acidente ou incidente, minha pergunta era outra, era o depois, o como, o que... e tudo que saiu de mim, e eu tentando ser delicada, mas eu tenho consciência que sou delicada feito um camelo com sede, foi “mas você se sente bem?”

Tive que reformular a pergunta umas 4 vezes, até ela entender o quão profundo eu queria chegar, e ela sorriu para mim e disse não tenho o que sentir, já passou, já chorei, já entrei em depressão, mas o que posso fazer? Não dá para voltar atrás, eu não posso sofrer por isso para sempre, tenho que prosseguir”.. E eu fiquei pensando nisso por quase um mês sem parar...

Eu tenho um problema com finais, sabe, ainda mais com o fato de que a coisa acabou e eu tenho que prosseguir, e seguir, e aceitar que acabou, aquela coisa de virar a página... não... espera, deixa eu reformular essa explicação, pois quando se vira a página, você não vê as páginas de traz, você virou ela, a coisa é como se... Você derrubasse tinta em um livro, fosse obrigada a virar as páginas e as próximas páginas estão manchadas com a tinta passada, que cada vez mais seca, cada vez mais eterna na historia, como se agora fizesse parte dela... Entende?

O braço dela... Prosseguir!? 

O acidente sempre vai estar ali, o acontecimento está no passado, não dá para voltar, mas a marca dele está ali, uma enorme cicatriz que levou embora uma parte física e emocional dela, toda vez que ela olhar para ela mesma, vai estar lá, o acidente, o resultado de um acidente.
Pedaços do emocional de alguém também se vão, ela não pode ser a mesma menina do dia antes do acidente, as coisas nunca são a mesma depois do dia da perda, você tem que prosseguir, não é? Lidar com isso, e logo amadurecer, e nisso parte da inocência se vai, dia após dia.

A gente perde muita coisa por dia e nem percebe, a gente perde horas, dias, minutos, e nem vê, por isso é tão fácil, mas a gente percebe isso quando a conta chega e vê que não dá para voltar atrás
Como eu encostada num canto olhando para meu celular esperado alguém notar meu sofrimento por esse alguém ali, são meses e meses, eu poderia estar ganhando, mas estou perdendo, aos poucos uma cicatriz vai surgindo, e quando ela estiver visível nada vai apagar...

...
E cara, ela perdeu o braço, e não foi aos poucos, foi de uma vez só, se coloca na situação, você está ali, sentado olhando para a janela, não esperando acontecer nada de mais, apenas perdida em pensamentos enquanto seus olhos fingem acompanhar cada arvore que parece correr lá fora, e em questão se segundos você está coberto do próprio sangue, e quando começar a calcular o que acabou de acontecer, você percebe que uma parte do seu corpo já não faz parte do seu corpo.
A partir daí é outra história, são os dias depois do acidente, os dias depois da perda, os dias depois do trauma, ter que se acostumar aos poucos, ser obrigado a lidar com um trauma.


Tem coisa que a gente meio que escolhe perder, nós no colocamos na posição de que simplesmente virar as páginas sem olhar cada palavra, a dor final é uma consequência. Mas como conviver com algo que não é sua culpa? Você não esperava... Como conviver com uma consequência cuja a causa não é culpa de ninguém?

Mas você tem que continuar, sempre tem a escolha mais fácil, desistir, a depressão ronda nossas mentes diariamente, esperando uma brecha no meio da nossa própria escuridão, e ela é longa e profunda, feito uma areia movediça, que você jura que não tem fim, mas lá no fundo, tem um buraco, a morte.
Mas você tem que continuar, tem que se dar uma chance de respirar, porque é só uma, você tem que puxar e soltar ar, perder lágrimas e desenhar um rastro até você, enquanto foge vulnerável dos olhares dos estranhos pelo mundo.
Mas como continuar? A gente vai perder de novo, vai acontecer, aos poucos, ou talvez sejamos vítimas de alguma fatalidade, ora essa, as chances existem para todo mundo.

Não sei o que vai acontecer amanhã, comigo, com ela, com você, eu sei o quão bosta eu lido com as perdas, e se eu perder mais? O mundo é tão inseguro, tão imprevisível, não existe limites para a perda... Oh sim, a morte...
Mas vai acontecer, enquanto estamos lutando para conquistar, enquanto nos debatemos no mundo lutando contra coisas aleatórias, enquanto suamos para construir coisas, estamos perdendo
E ai um dia... Você não vai poder perder mais nada, porque perdeu tudo.

E será que depois de perder tudo, nós ainda vamos ter capacidade de sorrir e recomeçar?

 (acho que ela nunca vai entender o porque de eu começar a chorar umas duas horas depois da gente mudar de assunto, minha cabeça as vezes trava em assuntos... admiro a força dela)


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